A operação lançada no Rio contra os traficantes é, até aqui, um êxito militar, mas uma incógnita -para dizer o mínimo- no que diz respeito à redução do consumo de drogas.
Os cidadãos podem até se sentir mais seguros com a tomada dos morros, como se tivéssemos desalojado de um território nacional tropas selvagens estrangeiras. Soldados são aclamados como heróis, ganham perfis no Facebook. Há uma grande chance de a operação ser um marco histórico no controle dos indicadores de violência. Só isso já justificaria plenamente a ação, mas a dúvida hoje, vendo a facilidade com que os marginais foram desmobilizados, é o motivo por que a ofensiva não foi realizada antes, o que só é explicável por uma dose de conivência com o tráfico.
O que vai acontecer agora não é o fim do tráfico, mas sua gradual sofisticação, sem tanto primitivismo e violência. A ocupação territorial, por mais complexa que pareça, é uma tarefa razoavelmente simples em comparação com o desafio da dependência química.
O que está fora disso são ilusões e pirotecnias.
Dezenas de milhares de policiais podem prender todos os dias traficantes, mas não vão extinguir a lei da oferta e da procura. Quanto maior a repressão, maior o valor dos produtos e, portanto, a atratividade do mercado e, é claro, maior a propina.
O melhor e mais difícil jeito de reduzir o dano é atacar o consumo para que as pessoas, mesmo que eventualmente usem drogas, não abusem. A semana que passou mostrou o efeito positivo de décadas de campanha de consciência sobre saúde.
O Dia Mundial de Combate à Aids apresentou dados indicando que, no mundo, a epidemia parou de se alastrar. No Estado de São Paulo, o número de mortes por causa do HIV é o menor em 20 anos. Isso ocorre por causa dos novos medicamentos, dos testes de detecção precoce e das insistentes campanhas por sexo seguro. A camisinha, enfim, entrou na cesta básica. O movimento foi tão bem articulado que obrigou o Vaticano a rever sua posição sobre os preservativos.
Dados do Censo 2010, divulgados na quarta-feira, revelam que a mortalidade infantil diminuiu rapidamente, embora a média ainda esteja alta mesmo para padrões da América Latina. A queda se deve, entre outros fatores, como saneamento básico, ao esforço pelo aleitamento materno e à divulgação de noções básicas de higiene. A expectativa de vida do brasileiro subiu para 73 anos.
Muitas das campanhas que ajudaram a aumentar a expectativa de vida foram arquitetadas por publicitários, permitindo a governantes e legisladores tirar as ideias do papel. É o que se vê no aumento das ações preventivas ao câncer de mama e até na redução do número de fumantes. As pessoas agora prestam mais atenção ao que comem e ao próprio peso e se incomodam com o sedentarismo.
Não há ainda no Brasil campanhas contra a dependência química com a inteligência e o charme utilizados para prevenir o câncer de mama ou o HIV. Ou então as campanhas pela defesa do ambiente: na semana passada, o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) divulgou que a Amazônia teve, neste ano, o menor desmatamento de sua história. Algumas das melhores cabeças publicitárias do mundo se envolveram na questão ecológica.
Bobagem tentar fazer campanhas moralistas, sombrias, quase terroristas, contra o vício. Outro erro é tentar colocar num mesmo saco todas as drogas. Qualquer droga é perigosa -aliás, excesso de açúcar e excesso de sal também matam. Maconha, porém, não é igual a cocaína, a crack ou a heroína.
O que de fato funciona contra o abuso do álcool e das drogas, como mostram inúmeras pesquisas, é aliar informação a estímulo aos jovens para montarem seus projetos de vida, ganhando autonomia. Os projetos educativos que funcionam ensinam, em essência, que a liberdade é um maravilhoso vício.
PS - A longo prazo, a única solução sustentável é legalizar as drogas, fiscalizar a sua fabricação para reduzir seus efeitos deletérios e gastar com prevenção e tratamento as verbas arrecadadas com as vendas. Qualquer medida hoje, agora, seria uma insanidade e, de resto, não encontraria respaldo na opinião pública. É algo para ser realizado aos poucos, em meio a um entendimento entre vários países. Especialistas lembram que as medidas liberalizantes poderiam inicialmente contemplar a maconha, que, segundo todos os estudos científicos, é menos perigosa do que o álcool e o cigarro.
Os cidadãos podem até se sentir mais seguros com a tomada dos morros, como se tivéssemos desalojado de um território nacional tropas selvagens estrangeiras. Soldados são aclamados como heróis, ganham perfis no Facebook. Há uma grande chance de a operação ser um marco histórico no controle dos indicadores de violência. Só isso já justificaria plenamente a ação, mas a dúvida hoje, vendo a facilidade com que os marginais foram desmobilizados, é o motivo por que a ofensiva não foi realizada antes, o que só é explicável por uma dose de conivência com o tráfico.
O que vai acontecer agora não é o fim do tráfico, mas sua gradual sofisticação, sem tanto primitivismo e violência. A ocupação territorial, por mais complexa que pareça, é uma tarefa razoavelmente simples em comparação com o desafio da dependência química.
O que está fora disso são ilusões e pirotecnias.
Dezenas de milhares de policiais podem prender todos os dias traficantes, mas não vão extinguir a lei da oferta e da procura. Quanto maior a repressão, maior o valor dos produtos e, portanto, a atratividade do mercado e, é claro, maior a propina.
O melhor e mais difícil jeito de reduzir o dano é atacar o consumo para que as pessoas, mesmo que eventualmente usem drogas, não abusem. A semana que passou mostrou o efeito positivo de décadas de campanha de consciência sobre saúde.
O Dia Mundial de Combate à Aids apresentou dados indicando que, no mundo, a epidemia parou de se alastrar. No Estado de São Paulo, o número de mortes por causa do HIV é o menor em 20 anos. Isso ocorre por causa dos novos medicamentos, dos testes de detecção precoce e das insistentes campanhas por sexo seguro. A camisinha, enfim, entrou na cesta básica. O movimento foi tão bem articulado que obrigou o Vaticano a rever sua posição sobre os preservativos.
Dados do Censo 2010, divulgados na quarta-feira, revelam que a mortalidade infantil diminuiu rapidamente, embora a média ainda esteja alta mesmo para padrões da América Latina. A queda se deve, entre outros fatores, como saneamento básico, ao esforço pelo aleitamento materno e à divulgação de noções básicas de higiene. A expectativa de vida do brasileiro subiu para 73 anos.
Muitas das campanhas que ajudaram a aumentar a expectativa de vida foram arquitetadas por publicitários, permitindo a governantes e legisladores tirar as ideias do papel. É o que se vê no aumento das ações preventivas ao câncer de mama e até na redução do número de fumantes. As pessoas agora prestam mais atenção ao que comem e ao próprio peso e se incomodam com o sedentarismo.
Não há ainda no Brasil campanhas contra a dependência química com a inteligência e o charme utilizados para prevenir o câncer de mama ou o HIV. Ou então as campanhas pela defesa do ambiente: na semana passada, o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) divulgou que a Amazônia teve, neste ano, o menor desmatamento de sua história. Algumas das melhores cabeças publicitárias do mundo se envolveram na questão ecológica.
Bobagem tentar fazer campanhas moralistas, sombrias, quase terroristas, contra o vício. Outro erro é tentar colocar num mesmo saco todas as drogas. Qualquer droga é perigosa -aliás, excesso de açúcar e excesso de sal também matam. Maconha, porém, não é igual a cocaína, a crack ou a heroína.
O que de fato funciona contra o abuso do álcool e das drogas, como mostram inúmeras pesquisas, é aliar informação a estímulo aos jovens para montarem seus projetos de vida, ganhando autonomia. Os projetos educativos que funcionam ensinam, em essência, que a liberdade é um maravilhoso vício.
PS - A longo prazo, a única solução sustentável é legalizar as drogas, fiscalizar a sua fabricação para reduzir seus efeitos deletérios e gastar com prevenção e tratamento as verbas arrecadadas com as vendas. Qualquer medida hoje, agora, seria uma insanidade e, de resto, não encontraria respaldo na opinião pública. É algo para ser realizado aos poucos, em meio a um entendimento entre vários países. Especialistas lembram que as medidas liberalizantes poderiam inicialmente contemplar a maconha, que, segundo todos os estudos científicos, é menos perigosa do que o álcool e o cigarro.
GILBERTO DIMENSTEIN
2 comentários:
Adorei o post, racional e informativo e o melhor: consciente.
Sim sim Didi.
Gosto bastante desse cara Gilberto D.
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